17 de agosto de 2021
Jejum de dopamina: benéfico para o cérebro ou moda passageira?

by:Caffeine Academy

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Se você acha que o jejum intermitente é a prática restritiva do momento, está enganado! O mais novo jejum em busca do pleno bem-estar não envolve dieta, em vez disso, tem por objetivo se abster de todas as atividades mais prazerosas do dia a dia.

Apesar da baixa popularidade no Brasil, o jejum de dopamina vem ganhando muitos adeptos no Vale do Silício - polo tecnológico americano e a região que frequentemente está entre as primeiras a adotar novas (e muitas vezes não cientificamente testada) estratégias para aumentar a produtividade e o bem-estar.

O que é o jejum de dopamina?

Basicamente, o jejum de dopamina promete melhorar o foco e a produtividade a partir da regulação dos níveis de dopamina produzido pelo corpo. Isso deve ocorrer através da abstenção completa de toda e qualquer coisa que lhe dê prazer, tais como:

  • o uso de smartphones;
  • acesso a mídias sociais;
  • videogame e Netflix;
  • consumo de comidas gostosas;
  • contato visual durante as conversas.

James Sinka tem 24 anos e adotou o jejum de dopamina. Fundador de uma startup em San Francis, quando faz jejum de dopamina, o empreendedor se desconecta de praticamente todo tipo de estímulo externo. 

Para de comer ou beber (ingere apenas água), ignora todas as notificações dos seus gadgets e evita interagir com outras pessoas o máximo possível — isso inclui qualquer tipo de contato visual.

Em resumo, o jejum de dopamina está atrelado a uma “desestimulação” do cérebro para melhorar sua eficiência, aumentando a produtividade pessoal e potencializando um melhor desempenho no trabalho.

Mas será que o jejum de dopamina é apenas uma forma reformulada de meditação antiga? Será uma maneira de beneficiar sua saúde mental ou só uma moda passageira do Vale do Silício?

O que é a dopamina?

A dopamina é um neurotransmissor — um mensageiro químico do cérebro — cuja atividade está ligada à motivação que temos para fazer as coisas. Isso quer dizer que quando a dopamina é liberada, ela  provoca sensações subjetivas de prazer, o que pode resultar na repetição de determinados comportamentos. 

Estes podem se basear em necessidades vitais do organismo, como sentir fome e sede ou comportamentos sociais. Além disso, a dopamina está envolvida nas emoções, nos processos cognitivos, no aprendizado, na capacidade de atenção, nos movimentos intestinais, e em muitas outras funções do corpo.

Então, o “jejum” de dopamina pode mesmo ajudar seu cérebro? Especialistas americanos dizem que talvez, mas não pelos motivos que seus adeptos pensam.

A ciência por trás do jejum de dopamina

A dopamina funciona ativando os neurônios de regiões específicas do cérebro, de modo a promover ou inibir certas atividades, de acordo com a necessidade. Talvez por isso, Sinka acredite que a liberação constante de dopamina pelo nosso cérebro nos deixa anestesiados, da mesma forma que alguém que consome drogas desenvolve uma tolerância.

Os jejuadores de dopamina concordaram com a ideia de que quanto mais somos expostos à alegria da dopamina, mais precisamos buscar níveis elevados de estimulação para obter o mesmo efeito.

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Cameron Sepah, um professor clínico de psiquiatria na Universidade da Califórnia e coach executivo, desenvolveu a prática um tanto mais refinada da prática, como uma forma de otimizar a saúde e o desempenho dos CEOs e capitalistas de risco com quem trabalha. Em seu guia sobre o jejum de dopamina, Sepah escreveu: 

“Dada a natureza sempre ativa e estressante de seus empregos, eles são propensos a comportamentos viciantes para suprimir o estresse e as emoções negativas. Fazer uma pausa nos comportamentos que desencadeiam grandes quantidades de liberação de dopamina (especialmente de forma repetida) permite que nosso cérebro se recupere e se restaure.”

Contudo, sua versão difere da versão adotada no Vale do Silício, que leva seu conceito a extremos. Isso porque, Sepah não recomenda evitar todos os estímulos - especialmente a interação humana, o que é benéfico -, defendendo o abandono apenas de comportamento problemático específico, como navegar nas redes sociais, pelo menos uma hora por dia.

Para ele, abster-se inteiramente de coisas como mídia social e tecnologia seria suicídio profissional, então, em vez disso, ele sugere a abstenção de curto prazo para reequilibrar suas vidas. Ele diz que seus pacientes relatam melhorias no humor, capacidade de concentração e produtividade - dando-lhes mais tempo livre para outros comportamentos saudáveis.

Mas nem todo mundo está tão convencido do valor do jejum de dopamina ou de seus benefícios efetivos. Para Joshua Berke, professor de neurologia e psiquiatria da Universidade da Califórnia, a dopamina não tem uma relação direta com 'prazer' ou 'felicidade'. 

Ele diz não ter conhecimento de nenhuma evidência para a afirmação feita por jejuadores de que evitar a tecnologia e os alimentos que causam sensação de prazer podem reduzir os níveis de dopamina no cérebro. 

“Certamente parece plausível dizer que fazer uma pausa na verificação obsessiva de sua conta nas redes sociais e se concentrar mais em si seja bom para você. Mas é improvável que tenha muito a ver com a dopamina em si. ”

Para Berke, fazer uma pausa de atividades emocionantes ou estressantes, pode ser relaxante e também bastante sensato, mas isso não é o mesmo que recusar-se a conversar com um amigo porque você está ‘tomando um jejum de dopamina' para seu bem-estar.

É claro que muitas pessoas têm procurando novas maneiras de escapar dos maus hábitos que resultam em respostas negativas para sua saúde e bem-estar, seja física, mental ou emocional, mas elas não encontrarão uma solução total no jejum de dopamina.

Até porque, lidar com tentações, sentimentos ou comportamentos negativos é muito mais saudável quando feito a partir da atenção plena, podendo ajudá-lo a encontrar maneiras de lidar com as situações difíceis que você encontra diariamente, enquanto ainda aproveita os pequenos prazeres da vida cotidiana.

 

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A paixão do público pelas tendências do Vale do Silício - e a percepção de que os empreendedores estão na vanguarda do desenvolvimento - também pode significar que estamos mais interessados, e talvez crédulos, nas iniciativas de bem-estar que surgem lá, mesmo que os especialistas digam que a ciência não está comprovada.

Por isso, da próxima vez que você se sentir entediado e pegando o telefone para percorrer as redes sociais sem propósito, faça uma pausa e observe o que está pensando e como se sente o seu corpo. Em seguida, escolha outra coisa para fazer, como dar um passeio, meditar, ler um livro ou preparar sua bebida favorita.

Autor:
Caffeine Academy